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jueves, 27 de junio de 2013

Una viaje de tren a Tigre

 1.    PRÓLOGO
Quando foi  dada a tarefa de escrever uma monografia sobre uma experiência vivida em Buenos Aires, pelo Prof. Luiz Etcheverry da disciplina Epistemologia, iniciei a pensar qual o significado dessa tarefa.
Algumas questões me ocorreram, a primeira delas foi: o que é experiência? A segunda, o que é intencionalidade? Como irei escrever essa experiência?
Responder essas questões através da experiência vivida será o desafio dessa monografia.
Durante a aula, nos foi dada uma lista com trinta e seis palavras, onde deveríamos fazer uma experiência de conhecimento em relação às palavras apresentadas, esse trabalho foi realizado grupalmente e apresentado em sala de aula.
Como tarefa para a aprovação da disciplina foi proposto um trabalho individual a partir das teorias vistas nas aulas.
Elegi como experiência: Estação Retiro. Viajar de trem a Tigre.
A motivação para escrever sobre esse tema foi a de conhecer um local que já havia ouvido falar, sobre a sua beleza e a partir daí criar os meus próprios conceitos acerca dessa cidade.
Em um texto de Deleuze y Guattari apresentado por Etchevery, trás que de acordo com o veredito nietzschiano, não se pode conhecer nada mediante a conceitos, a menos que se haja sido criado anteriormente. Conceitos são pontes móveis, então eles são mutáveis o conceito que temos hoje sobre algo, pode não ser o mesmo amanhã.
Elegi essa ideia força por acreditar que poderia ser uma experiência carregada de significado, pois iria agora ter as minhas próprias impressões sobre essa viagem.
Para escrever essa monografia, utilisei o método qualitativo de abordagem descritiva, pois possibilita contemplar com mais propriedade o conjunto de elementos que envolvem a monografia. Metodologia essa, definida por Minayo (2007), como aquela capaz de incorporar a questão do significado e da intencionalidade como os atos, as relações e as estruturas sociais. Tendo a potencialidade de aprender e analisar os acontecimentos, as relações, os momentos e o processo como parte de um todo.
A abordagem qualitativa realiza uma aproximação fundamental e de intimidade entre sujeito e objeto, uma vez que ambos são da mesma natureza: ela se envolve com empatia aos motivos, às intenções, aos projetos dos atores a partir dos quais as ações, as estruturas e as relações se tornam significativas. (Minayo, 2007)
.2.  DESARROLLO
Em um domingo frio e nublado do mês de julho, saímos em direção à estação Retiro que ficava a poucas quadras do hotel. Durante a caminhada pude perceber a diferença da paisagem que conheci em Janeiro, o céu cinzento, as arvores secas poucas pessoas nas ruas.
Chegando a estação compramos o bilhete e enquanto esperávamos fiquei a observar as pessoas. Eram pessoas muitos diferentes, turistas, pessoas que estavam ali a passeio, vendedores, outras que retornavam à suas casas.
Finalmente o trem chegou, entrei, escolhi um lugar ao lado de uma janela.
Começou a minha aventura rumo a Tigre.
Assim que o trem partiu me veio à mente a pergunta apresentada no seminário: Que significa fazer uma experiência? De acordo com o texto apresentado por Etcheverry, Heidegger nos diz que fazer uma experiência significa algo, que nos passa, que nos ocorre, algo que nos alcança, nos possui e nos transforma.
Ainda no texto encontramos que se deixamos de lado o voluntarismo e nos disponhamos de modo receptivo-passivo a que esse algo aconteça, a obra será fruto de um dialogo vinculante com o mundo.
Percebi que fazer uma experiência é andar e desandar porcaminhos desconhecidos e retornar e retornar ao lugar onde já nos encontrávamos.
Quando comecei a escrever essa monografia busquei o significado de experiência. Em Japiassu 2001, encontrei que em seu sentido geral, a experiência é um conhecimento espontâneo ou vivido, adquirido pelo indivíduo ao longo de sua vida. Em seu sentido técnico, experiência é a ação de observar ou de experimentar com a finalidade de formar ou de controlar uma hipótese.
Lembrei também que no texto de Heidderger, Etcheverry, cita Hugo Mojica onde o autor fala que viajar é expandir a mente, sobretudo, é saber que o absoluto aqui é relativo em outro lugar. Entendi com essa citação que viajar é nos transformar e na volta nada será igual.
Parafraseando Mario Quintana, viajar é trocar a roupa da alma.
A viagem começa passando por lugares já conhecidos, av. Del Libertador, Palermo, Hipódromo... Aí veio a mente a frase de Suzuki, “quando se estuda deve-se fazer uma limpeza da casa”, percebi então que deveria apagar o que já tinha em mente daqueles lugares e começar por um vazio. Esse é o principio da vacuidade nos ensinado por Suziki quando o mesmo nos fala que a verdadeira existência vem da vacuidade e volta novamente a ela.
Nesse momento comecei a observar tudo àquilo com um novo olhar. Agora como se fosse tudo aquilo desconhecido, vi favelas, sujeira, lixo, casas velhas. Percebi as pessoas que viajavam no trem. Casais de namorados, enamorados, famílias, crianças sorrindo, outras chorando, velhos, havia muitos velhos viajando naquele trem. Entravam e saiam muitos vendedores, alguns cantavam e tocavam instrumentos.
Comecei a perceber que havia vida naquele trem.
Voltei a lembrar do Texto, que significa fazer uma experiência? E a citação de Heiddeger que nos diz: só podemos experimentar o que nos espera de uma viagem na própria carne, para isso é necessário o despojo. Assim me despojei me determinei a dar um significado aquela viagem.
Buscando o conceito filosófico de significado, encontrei em Japiassú 2001, que é a relação entre o signo linguístico e o real, o objeto designado pelo signo.  Duas palavras sinônimas podem ter a mesma referencia, mas terem sentidos totalmente distintos. Outro aspecto da compreensão do significado diz respeito aos tipos de uso que uma expressão pode ter em contextos diferentes e para objetivos diferentes, o que determina uma diferença de significado.
Dai comecei a entender o que o professor pretendia quando falou sobre a realização dessa monografia, sem, entretanto dar-nos nenhuma orientação de como deveríamos fazê-la. Ele pretendia que essa monografia não fosse baseada em explicação, mas sim na emancipação que pode se tornar efetiva pela vontade e desejo de aprender.
No prologo do seu livro O Mestre Ignorante, na edição em português, Ranciere (2002) nos ensina que não há ignorante que não saiba uma infinidade de coisas, e é sobre esse saber que  todo ensino deve-se basear.
Passamos por muitas estações e cruzamos províncias. Rivadavia, Vicente Lopez, Martinez, Acassuso, San Isidro, Beccar. Vi também a beleza de Olivos, com suas belas casas. Vi estações abandonadas e com muita pobreza.
Cerca de cinquenta minutos chegamos a Tigre. Descemos em uma bela estação que foi inaugurada em 8 de maio de 1893 e reformada em abril de 1966. Lá sentamos um pouco para decidir o que fazer. Resolvemos caminhar pela margem esquerda do rio, pois na direita, havia muitas pessoas, principalmente turistas.
No inicio da caminhada, vi um rio negro, com aguas sujas e fétidas. Ali era a saída dos catamaranes para o passeio pelo Delta, mas logo adiante vi muitas aves que se alimentavam do produto daquela poluição. Fomos na direção do circuito turístico.
Na margem esquerda encontrei um parque infantil com muitas crianças brincando, muitos jovens sentados na grama namorando, famílias passeando. Vi também muitas pessoas andando de bicicleta. No rio pessoas remando e passeando em pequenas e grandes embarcações.
Percebi que naquela margem podia vê um típico domingo dos moradores daquela cidade, tranquilo sem agitação.
Olhando para a margem direita via clubes náuticos, a estação fluvial, o Capitan Paraná um grande parque infantil.
Continuando andando pela margem esquerda encontramos o Museo Del Mate. O local estava fechado, mas fomos informados que ali conta toda a historia do mate, desde a descoberta da erva até os tempos atuais, que esse é um grande costume entre os argentinos. Conta com cerca de duas mil peças entre cuias, livros sobre o costume de “matear”.
Vimos o Clube Suisso, o Clube de Regatas America, a Prefeitura Naval Argentina e mais adiante o Monumento al Remero que homenageiam aqueles que deram gloria a Argentina nesse esporte. O monumento está localizado no encontro do Rio Tigre e o Rio Luján.
Adiante vimos o Clube de Regatas da Marinha. Vimos também muitas placas de “proibido pescar e nadar”. Conversei com um guarda que não quis se identificar, ele é  nascido na cidade de Corrientes, mas mora em Tigre. Ele nos disse que naquela região era proibido nadar e pescar por causa da poluição, mas nas ilhas do Delta tinham muitos lugares para pesca e banho.
Já passava das duas horas da tarde quando paramos para almoçar. Fomos ao restaurante El Tio, lá conhecemos Marina, uma simpática garçonete que nos falou que era nascida em  Santiago Del Esteio, mas que morou muitos no Brasil. Falava fluente o português e nos comunicamos bem. Sugeriu-nos para comermos um bife de chorizo a la pizza. Um saboroso e farto prato que saciou a nossa fome.
Descansamos um pouco e retomamos a caminhada. Voltamos e fomos em direção à margem direita do rio. Essa margem era totalmente diferente da outra, cruzamos com muitas pessoas, famílias, jovens, muitos turistas.
Fomos ao Parque da Costa, Estação Delta e ao Cassino Trilenio, passamos rapidamente por cada um desses locais.
A estação Delta é um lugar bucólico, de onde parte o Trem da Costa até a estação Maipu. Esse trem viaja quase todo o trecho passando pelo Rio La Plata e pelas suas matas.
Depois fomos ao Cassino Trilenio, um lugar muito luxuoso com muitas maquinas e mesas de jogo. Chamou a minha atenção a quantidade de pessoas idosas jogando, percebi que muitas delas estavam ali sozinhas sem acompanhantes. Os idosos na Argentina possuem muito mais autonomia que no Brasil.
Já passavam das 16h e resolvemos retornar a CABA. O passeio pelo Delta teria que ficar para outra ocasião, outra experiência.
No retorno o trem estava muito cheio, havia muitas pessoas. Elas estavam alegres e conversavam e riam alto.
A certa altura entrou um senhor bem idoso, que tocava um bandoneon, um instrumento de origem alemã, mas  muito comum naquela região. Tocou uma bela musica. Perguntei a um jovem que estava na minha frente se ele conhecia aquela musica, ele me respondeu que era El Mundo de Piazzola, que é um compositor argentino que inovou o tango e criou um gênero que ficou conhecido como nuevotango, com muitas influencias do jazz norte americano.
Como estava uma tarde ensolarada e quente vi  muitas pessoas jogando tênis, futebol, rugby. O hipódromo de Palermo estava cheio.
Quando chegamos de volta a Estação Retiro já era mais de 17 horas.
Retornamos a pé para o hotel, estava muito cansada, mas feliz com a experiência vivida.

4.CONCLUSION
A viagem de volta pareceu ser mais rápida. Durante todo o trajeto vim pensando na experiência que vivi naquele domingo, lembrei-me do texto de Etcheverry, quando o mesmo cita “ a atenção é algo  diferente da concentração”. Neste texto Krishnamurti ensina que quando nos concentramos nada vemos, mas quando prestamos atenção vemos muito. Percebi quanta verdade havia nessas palavras, quando prestei atenção, vi coisas que passaram despercebidas em uma ocasião anterior que fiz essa mesma viagem.
Realizei a viagem carregada de intencionalidade, que segundo Japiassu
( 2001) é a característica definidora da consciência, na medida em que está necessariamente voltada para um objeto: "Toda cons-ciência é consciência de algo". Esse autor também ensina que a consciência só é consciência a partir de sua relação com um mundo já constituído, que a precede. Por isso digo que a viagem tinha intencionalidade, mas ainda ignorava como escrever a experiência.
Encontrei essa resposta na leitura de o Mestre Ignorante de  Ranciere ( 2002).
Ranciere narra à aventura do mestre Jaques Jacotot, vivida no século XIX, onde o mesmo versa que o ato de aprender poderia ser efetivado sob diferentes perspectivas: por um mestre emancipador ou por um mestre embrutecedor, por um mestre sábio ou por um mestre ignorante, e nos faz refletir que pode - se ensinar o que se ignora, desde que se emancipe a aluno, mas para isso o próprio mestre deve ser emancipado.
Essa forma de aprendizado foi denominada pelo autor de Ensino Universal, que preconiza uma aprendizagem sem um mestre explicador, cujo principio de baseia em aprender e saber aplicar esses conhecimentos, estabelecendo relações e ligações com conhecimentos anteriores.
A partir dessa leitura comecei a compreender o que o professor queria, e como poderia escrever essa monografia.
Ranciere escreve que todos os homens possuem igual inteligência e   “que só um homem pode emancipar outro homem”.  Então entendi que todos os meus colegas ignoravam o que fazer e assim todos estavam em igualdade de conhecimento e emancipados para buscar esse conhecimento.
Através de Ranciere, entendi que é necessário inverter a lógica do sistema explicador, desenvolvendo, assim, um método de ensino e aprendizagem não mais baseado na explicação, mas sim na emancipação, que se pode tornar efetiva pela vontade e pelo próprio desejo de aprender ou, mesmo, pelas contingências da situação.
Portanto a leitura dessa obra nos faz refletir que se pode ensinar o que se ignora desde que se emancipe o aluno, instigando-o a usar a sua própria inteligência. Mas, para isso, é imprescindível que o próprio mestre seja emancipado para que possa dar início ao círculo da emancipação, assim ambos tornam–se sujeitos do processo em que crescem juntos.
A teoria do Ensino Universal de Jacotot, nos colocou naquele momento, em igualdade, ou seja todos nada sabiam sobre como elaborar essa monografia, e assim cada um iria buscar de forma emancipada os caminhos para a elaboração.
Concluo essa dissertação mais uma vez citando Ranciere:

“ A igualdade é fundamental e ausente, ela é atual e intempestiva,
sempre dependendo da iniciativa de individuo e grupos que,
contra o curso natural das coisas, assumem o risco de verifica-la,
de inventar as formas, individuais e coletivas, de sua verificação.
Essa lição, ela também é nunca que mais atual.”

Jacques Rancière
Maio de 2002





BIBLIOGRAFIA


1.    BARBOSA, A. M.  Ciência e Experiência:  Um ensaio sobre fenomenologia do espírito de Hegel ( recurso eletrônico) Porto Alegre, EDIPUCS, 2010

2.    ETCHEVERRY, L.M.   ?Qué significa hacer uma experiência?- Julio 2012.

3.    ________________De “Shopenhauer como educador”. Tercera  Consideración Intempestiva. Publicada em Madrid, em septiembre de 1999. Julio 2012

4.    ________________ Epistemologia y Educación – ICC- USAL . Julio 2012

5.    ________________  Intruducion a “ Qué  es um concepto ? ” de G. Deleuze y F. Guattari. Julio 2012

6.    ________________Método zen de estúdio a partir de Shunryu Suzuki. Julio 2012

7.    ________________ Seleccion de Textos de La estructura de las revoluciones cientificas . De Thomas Kuhn. Julio de 2012.

8.    JAPIASSU, H. MARCONDES, D. Dicionário Básico de Filosofia – 3ª Eidição. Jorge Zahar Editor, Rio de Janeiro, 2001.


9.    MINAYO, M.C. de S. O desafio do Conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde.-10. ed. São Paulo . Hucite/Abrasco, 2007

10.  RANCIERE, J. O mestre ignorante – Cinco lições sobre a emancipação intelectual. Belo Horizonte, Editora Autentica,2002.